17 de outubro de 2016

PEC 241 pode congelar pior verba de ciência dos últimos anos


A PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 241, ou PEC do Teto, que institui um novo regime fiscal por vinte anos, pode congelar o pior orçamento para a ciência dos últimos sete anos.
Caso a emenda seja aprovada, o crescimento dos gastos públicos estará limitado à taxa da inflação. O problema, dizem cientistas, é que o atual dispêndio em ciência, tecnologia e inovação está tão baixo que mal consegue suprir o funcionamento das atividades de pesquisa em andamento. Avançar, então, nem pensar.
"Viramos um player importante na ciência mundial. Agora vamos começar a recuar", diz a biomédica Helena Nader, presidente da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência). Para ela, a PEC 241 vai congelar "o pior cenário da ciência nacional dos últimos anos."

Para 2017, a previsão é de R$ 5,9 bilhões –incluindo, aqui, a fatia de Comunicações. A pasta foi unificada ao antigo MCTI (Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação) no governo Temer (PMDB). O físico Luiz Davidovich, presidente da ABC (Academia Brasileira de Ciências), diz que o montante está em "um patamar muito baixo". "Vamos ficar estacionados numa situação que já é muito ruim."Para se ter uma ideia, o orçamento federal para a ciência brasileira neste ano é de R$ 4,6 bilhões –cerca de 40% menos do que montante investido pelo governo em 2013 (R$ 7,9 bilhões), desconsiderando perdas pela inflação.

Hoje, a ciência produzida nas universidades e nos institutos de pesquisa se alimenta principalmente do orçamento federal, que compra equipamentos e paga bolsas para alunos de pós-graduação (que tocam as pesquisas).
"Como vamos lidar com problemas crônicos como o que vivemos neste ano em relação ao zika vírus?", pergunta a cientista de computação Francilene Garcia, presidente do Consecti (Conselho Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de CT&I). "Não vamos conseguir produzir as tecnologias que precisamos para o desenvolvimento do país."
Os cientistas estão inconformados: a SBPC e ABC estiveram juntas em Brasília nesta semana e entregaram uma carta individualmente a todos os deputados antes da votação da PEC.
No documento, as duas entidades diziam que entendem a necessidade do ajuste fiscal. "No entanto, reduzir os investimentos públicos em educação, ciência, tecnologia e inovação vai na contramão dos objetivos de se efetivamente tirar o Brasil da crise."
A área da ciência nem sequer é mencionada na PEC 241, como acontece com saúde e educação. A expectativa, no entanto, é que com o reajuste fiscal proposto o orçamento de 2017 para ciência fique estagnado ou, pior, temem os cientistas, sofra até mais cortes no futuro.
Marcos Oliveira/Divulgação/Agência Senado
Ministro do MCTIC, Gilberto Kassab
Ministro do MCTIC, Gilberto Kassab
"Estou destruída", disse Helena à Folha, ao telefone, em seu caminho de volta de Brasília. Quem também estaria "destruído", conforme apuração da reportagem, é o próprio ministro do MCTIC, Gilberto Kassab, que assumiu a pasta prometendo lutar por mais recursos para a ciência.
Oficialmente, o MCTIC disse, em nota, que a PEC 241 não determina corte de despesas, "mas, sim, estabelece um ritmo de crescimento da despesa mais lento que o atual." E continua: "o governo federal não apenas está ciente como se mostrou sensível às legítimas e acertadas demandas da comunidade científica de que é importante preservar os programas e as pesquisas em andamento."
'LEI ROUANET'
De acordo com Helena e Francilene, o meio acadêmico vai brigar para a obstrução da PEC 241 no Senado. Também deve correr atrás de formas alternativas de financiamento. Uma das propostas seria uma espécie de "Lei Rouanet da ciência" que permita que empresas invistam em pesquisa científica em troca de benefícios fiscais, assim como fazem em cultura.
O coro para que a PEC 241 não passe pelo Senado, no entanto, tem exceções no meio acadêmico.
Para o biólogo Marcelos Hermes-Lima, da UnB, os cortes são inevitáveis. "Vivemos tempos muito difíceis", diz. "Cada segmento da sociedade tem de dar uma dose de sacrifício." O também biólogo Mauro Rebelo, da UFRJ, concorda: "não é o limite de gastos que vai determinar o futuro da nossa ciência." 

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