30 de setembro de 2016

O novo ensino médio já nasce velho Isaac Roitman

Pensaraeducação 30/09/2016
A Medida Provisória 746 que institui a modificações no Ensino Médio foi recentemente enviada ao Congresso Nacional alterando Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira de 1966. Talvez o maior mérito dessa iniciativa foi colocar a educação na pauta midiática.  Várias questões da MP devem ser debatidas. O ensino da arte e a educação física será facultativa no ensino médio e continuará a ser obrigatória na educação infantil e fundamental. O currículo obrigatório será composto por itinerários formativos específicos nas seguintes áreas: 1. Linguagens; 2. Matemática; 3. Ciências da natureza; 4. Ciências humanas e 5. Formação técnica e profissional. Parte do Currículo poderá ser construído pelo estudante.  Será implementado o tempo integral com a carga horária anual de 1400 horas. Fica também instituída o fomento, com repasse de recursos do Ministério da Educação para os Estados e para o Distrito Federal. Será facultado a participação no ensino de profissionais com notório saber reconhecido pelos respectivos sistemas de ensino superior para ministrar conteúdos de áreas afins à sua formação. A sociedade não pode se omitir na discussão desses assuntos.
A primeira indagação é entender quais as razões do ensino médio ser o foco da reforma educacional. Provavelmente pelos altos índices de reprovação e evasão e pelos resultados negativos nas avaliações feitas através do IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). A educação brasileira não dará um grande salto com pequenas transformações embora propostas com boas intenções. Todo o sistema educacional precisa ser novamente construído. Em primeiro lugar precisamos entender que uma coisa é falar em tempo integral, outra em educação integral. Impor um tempo maior de permanência na escola sem novas motivações e atrativos será aumentar a tortura dos estudantes brasileiros. A educação integral implica em dar uma formação virtuosa para o relacionamento entre os seres humanos, mais solidária, ética e justa assim como um relacionamento consciente do ser humano com a natureza. É preparar o futuro adulto para exercer um protagonismo na sociedade e ter um trabalho que lhe proporcione uma vida digna. A velha pedagogia de aula expositiva deve ser sepultada. Como pregava Paulo Freire o protagonismo motivado deve ser um elemento fundamental para a construção de um novo sistema de aprendizagem. A utilização inteligente dos recursos dos progressos das tecnologias de informação e comunicação devem ser priorizadas, assim como a educação à distância. A formação de novos professores deve ser revista. O “novo Professor” não será um mero depositário de conhecimento. Ele terá a capacidade de avaliar os potenciais e os problemas de cada estudante. Ele deve ser competente em identificar e mediar conflitos e ser um estimulador para o exercício do pensar e de estimular a crítica argumentada. Ele deve ser valorizado e estar no faixa salarial superior da carreira de servidor público. Devemos caminhar no sentido da gradual abolição das disciplinas. O enfoque deverá ser interdisciplinar e a aprendizagem ser feita através estudos temáticos e de resolução de problemas. A estética, as artes e a educação física deverão estar presentes no cotidiano escolar. O diálogo com a sociedade, que aproximara a escola do mundo real, deverá ser permanente. A infraestrutura e a arquitetura da escola deverá ser orientada para que ela seja um “espaço encantado” com a missão de formar seres humanos que possam construir  um mundo realmente civilizado, sem injustiça social.
É importante a análise e o acompanhamento do que ocorre em países que tem alcançado um patamar virtuoso na educação. Um deles é a Finlândia onde a grade horária é mais flexível para que o estudante entre em contato com conceitos de economia, história, geografia e línguas estrangeiras de modo transversal com a ajuda de temas do cotidiano. Essa nova lógica do aprendizado invade também o ensino superior desse país. Por exemplo, um curso de Administração tem disciplinas tradicionais no primeiro ano, nos dois anos e meio seguintes, os alunos deixam de ter professores, passam a ter tutores, formam empresas reais e aprendem enquanto desenvolvem o negócio. Nesse novo ambiente de aprendizagem colaborativas diversos professores trabalham simultaneamente com um mesmo grupo de alunos. A metodologia baseada na resolução de problemas está ganhando protagonismo no ensino finlandês, em detrimento da aula tradicional. Mesmo no ensino fundamental finlandês o ensino está cada vez mais focado no desenvolvimento de habilidades e não apenas na assimilação do conteúdo tradicional. Na educação infantil da Finlândia as escolas estão focadas totalmente nos jogos e nas brincadeiras e na aprendizagem alegre e divertida através do contato com a natureza, músicas, dança, esportes e outras atividades lúdicas.
Um outro exemplo que deve servir de inspiração para uma revolução educacional brasileira é a Escola da Ponte (Portugal) implantada pelo educador José Pacheco que atualmente ajuda a implantar projetos semelhantes no Brasil. Nessa escola, onde não há aulas expositivas, séries e exames, cada estudante é reconhecido como único, integrante de uma cultura, origem e estrutura familiar singular. Ela visa a formação de pessoas autônomas, responsáveis, solidárias, cultas e democraticamente comprometidas na construção de um destino coletivo e de um projeto de sociedade que potencialize a afirmação das mais nobres e elevadas qualidades de cada ser humano.
É chegada a hora de romper com o tradicional iluminismo educacional que insiste na transmissão de conteúdos e na formação social individualista e em um coletivo que obedece aos comportamentos construídos por uma mídia perversa a serviço do mercado. É pertinente lembrar o pensamento de John Dewey, com quem Anísio Teixeira conviveu: “A educação é um processo social, é desenvolvimento. Não é a preparação para a vida, é a própria vida”

MP do Ensino Médio pode ter efeitos contrários aos pretendidos, dizem especialistas




Há um consenso entre especialistas, pesquisadores, estudantes, professores, gestores públicos e movimentos sociais sobre o Ensino Médio: o reconhecimento de que esta etapa escolar – essencialmente propedêutica, conteudista e pouco dialógica com a realidade dos estudantes – necessita de mudanças.


Prova disso são algumas iniciativas do próprio governo federal, como o Programa Ensino Médio Inovador ProEMI, instituído em 2009, que tinha como pauta promover a inovação curricular, ampliar o tempo dos alunos nas escolas e promover uma formação integral. Outra medida foi o Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio, de 2013, que representava a articulação entre União, estados e municípios também prevendo elevar a qualidade na etapa.
MP nº 746
Institui a Política de Fomento à Implementação de Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral, altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, e a Lei nº 11.494 de 20 de junho 2007, que regulamenta o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, e dá outras providências.
Na semana passada, um novo capítulo foi inaugurado. A reforma esperada para o período final da Educação Básica veio por meio da Medida Provisória (MP) nº 746, de 22 de setembro de 2016, que institui a Política de Fomento à Implementação de Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral.
Avanço questionável
Dentre as críticas ao projeto está justamente o fato dele vir em forma de MP, um instrumento com força de lei adotado pelo presidente da República em casos de relevância e urgência, o que evidenciou a falta de um debate com a sociedade.
O ministro da Educação, Mendonça Filho, alegou que a MP foi resultado de um quase consenso, com o apoio de praticamente todos os secretários estaduais, como declarou à reportagem da Folha de S. Paulo. Mendonça também colocou que a medida torna-se necessária porque a atual proposta que tramita na Câmara dos Deputados – Projeto de Lei nº 6840/2013, do deputado Reginaldo Lopes (PT-MG) – não avança na tramitação desde 2013. A explicação, no entanto, não convenceu setores da sociedade civil que se dedicam a pensar o tema.
Procurado pelo Centro de Referências em Educação Integral, o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG) colocou que o PL 6840 é fruto de uma intensa discussão com as representações educacionais, iniciada em 2012. E que, após a sua aprovação em 2014, foi proposto um texto substitutivo, sob o acordo de que ele voltaria para ser debatido, o que aconteceu em 2015 e ao longo deste ano. No momento, o deputado estava preparando substitutivo global para então levá-lo a plenário. “Eu repudio a forma como a reforma foi apresentada por desconsiderar três anos e meio de trabalho com a sociedade. Estávamos construindo as convergências necessárias para a reforma”, declarou.
Daniel Cara, coordenador-geral daCampanha Nacional pelo Direito à Educação fala em “antirreforma” por entender que, por princípio, toda mudança dessa natureza precisa ser discutida. Organizações como o Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec) e aAssociação Nacional de Pós Graduação e Pesquisa em Educação (Anped) também criticaram a medida por meio de nota oficial.
“O uso de uma MP para tratar de uma temática importante no âmbito educacional emite o claro sinal de que se trata de um governo avesso ao diálogo. O uso de MP apesar de ser previsto na lei deve ser excepcional. A que interesses obscuros serve uma reforma feita de maneira autoritária e que atropela processos de discussão em curso na Câmara dos Deputados?” questiona a Anped.
A inquietação também é compartilhada por Natacha Costa, diretora da Associação Cidade Escola Aprendiz. “Parece evidente que não se transforma a cultura institucional dos sistemas por decreto. Assim, uma ideia com potencial de mobilizar a transformação desta importante etapa, corre sérios riscos de cair em descrédito, de agravar as tensões nesse campo e de nos fazer retroceder ainda mais”, pontuou.
Base das mudanças
Para implementar a Política de Fomento à Implementação de Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral, a medida altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº9394, de 20 de dezembro de 1996) e a Lei que regulamenta o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Lei nº 11.494 de 20 de junho 2007).
No que tange à LDB (veja o documento alterado pela MP), as mudanças surgem no bojo da educação em tempo integral e da flexibilização escolar (na perspectiva de que os alunos tenham mais autonomia diante de seus percursos formativos).
Algumas implicações da MP
  • amplia a carga mínima anual para 1400 horas;
  • retira a obrigatoriedade do ensino de Educação Física e Artes no Ensino Médio;
  • retira a obrigatoriedade da Filosofia e da Sociologia;
  • inclui a formação técnica e profissional como componente curricular obrigatório;
  • reconhece a obrigatoriedade do ensino de língua portuguesa e matemática nos três anos do ensino médio.
Práticas pedagógicas
Anna Penido, diretora executiva do Inspirare, reconhece que a flexibilização é uma das demandas dos estudantes. Recentemente, o Porvir – um dos programas do instituto – lançou a pesquisa “Nossa Escola em (Re) construção: A escola que os jovens querem” que tomou como base a opinião de 132 mil jovens no país. “Eles dizem com todas as letras que querem ter a capacidade de escolher alguns conteúdos e disciplinas ao longo da jornada escolar. A questão é que para além dos componentes curriculares tradicionais, eles querem outros conteúdos, como preparação para relações humanas e sociais, políticas, direitos humanos e cidadania”, observa.
Em sua leitura, os percursos formativos têm como foco as disciplinas e a dimensão profissional. “Eu não consigo ver um parágrafo onde é dito que o Ensino Médio deve ter como proposta a educação integral, e isso me preocupa muito”, aponta.
Outra preocupação da especialista se relaciona com a implementação da proposta. “O MEC fala que cada escola vai fazer seu arranjo para oferecer o trajeto formativo. Agora, isso vai ser dado a partir da disponibilidade da escola ou do interesse do aluno? Se for a primeira opção, as chances do estudante ter os seus desejos contemplados diminui, então, é preciso pensar em como se organizam essas ofertas”, questiona Ana.
Ela ainda chama a atenção para a inviabilidade de se pensar percursos flexíveis com as mesmas práticas pedagógicas que são hoje aplicadas nas escolas. “Eu passo a ter mais tempo na escola, mas se terá mais tempo do mesmo? Além da flexibilização, os jovens querem práticas pedagógicas que dialoguem com eles, que os engaje, os entusiasme, como projetos, rodas de conversas, uso de tecnologia, entre outros recursos”, completa.
A especialista entende que os programas de educação integral têm que ter foco no protagonismo do aluno, trazer outros conteúdos para além dos tradicionais e alcançar práticas mais interativas. “É menos o tempo por si só e mais o que ele permite”, afirma.
Em nota, o Cenpec questiona a existência de ações específicas para sanar os déficits de aprendizagem dos estudantes que ingressam hoje no Ensino Médio de forma a prepará-los para escolher de forma qualificada as suas possibilidades de itinerários formativos e de projeto de futuro. “É preciso lembrar que as escolhas dos jovens são feitas conforme a sua condição social, ou seja, de acordo com as oportunidades que tiveram ao longo da sua vida”, relatou trecho da publicação.


Na leitura de Daniel Cara, o discurso da flexibilidade é apenas um chamariz para a medida provisória. A seu ver, há uma inflexibilidade colocada quando o estudante é obrigado a trilhar alguns itinerários a partir de uma Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que sequer foi apresentada.
“Quando você observa que a profissionalização vai exigir exclusivamente aprendizado em Língua Portuguesa, Matemática e Língua Inglesa, retirando Educação Física e Artes, o ponto central é que se vai dividir a sociedade brasileira entre aqueles que vão ser tomadores de decisão e que vão optar por itinerários que não o da profissionalização, e os subordinados que vão pela profissionalização e não terão muitas chances de ingressar em uma boa universidade, de poder realizar de maneira plena sua vida. O Brasil volta a ser um país que não só reproduz, como alimenta a desigualdade na educação, mais do que acontece hoje”, condena Cara.
O pesquisador Carlos Artexes Simões também fez uma análise sobre as mudanças e fala em retrocesso quando olha para a formatação do currículo. Para o especialista, a LDB já se caracterizava pela grande flexibilidade e descentralização e a medida provisória, ao contrário do que alega, promove uma prescrição e centralismo federal com o engessamento do currículo do Ensino Médio.
Financiamento
Outro ponto preocupante e que tem sido menos debatido, na visão de Daniel Cara, é a questão do financiamento. Ele explica que, desde 2007, senadores e prefeitos disputavam os recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) com base em balizas coerentes.
Com a MP, ele entende que o Ensino Médio passará a ser sobrefinanciado em relação à Educação Infantil e Ensino Fundamental, ou seja, o financiamento da etapa se dará em detrimento a todas as demais modalidades. “O resultado é que os prefeitos vão ter menos recursos para lidar com a expansão da Educação Infantil que hoje é principal demanda dos pais, até maior que no Ensino Médio”, avalia.
Cleuza Repulho, ex-presidente da Undime e especialista do Conviva Educação, é categórica ao dizer que não se resolve educação dividindo recursos. “É preciso ampliar a linha de financiamento; dividir só precariza o que já existe”.
Outra crítica recai sobre o fato de que a MP não apresentou a sua planilha de custos. “Os governos responsáveis não podem se eximir de apresentar as planilhas de custos de suas políticas, já tínhamos feito essa crítica ao governo Lula quando encaminhou oPlano Nacional de Educação (PNE) sem planilha de custos”, complementa o especialista.
Ainda para Cara, a MP reforça a linha do atual governo. “ O governo Dilma já escanteava o PNE, mas fazia com que a política, ainda que sem os recursos necessários, fosse uma medida referencial da ação do governo. Com a medida provisória, esse governo não só mantem o escanteamento do plano em termos de financiamento e gestão prática, como tenta substituí-lo por essas iniciativas. A medida não dialoga com o calendário do PNE, o que demonstra uma irresponsabilidade com o que está na Lei, uma falta de compromisso público com a gestão do estado brasileiro”, aponta.
Análise positiva
Para a subsecretária de Educação de Alagoas, Laura Souza, os dissensos em torno da medida provisória são fruto de problema de interpretação. Em entrevista cedida ao G1, a gestora colocou que ao organizar os conteúdos e os componentes curriculares de outra maneira, a reforma contribui para atribuir identidade às escolas, hoje muito padronizadas, além de permitir aos estudantes que estejam mais próximos de seus projetos de vida.
Ela também colocou que o teor da proposta representa um processo de construção, iniciado há pelo menos dois anos, com os técnicos que trabalham com o Ensino Médio nas Secretarias do Estado da Educação e que está de acordo com o que foi enviado pelo Conselho Nacional de Secretários da Educação (Consed) ao MEC.
“Acredito que a MP tinha o objetivo de fomentar o debate e acho que isso foi alcançado. A etapa da educação básica estava muito estagnada, sem políticas públicas, por isso enxergo esse processo de maneira muito positiva”, declarou. A gestora também negou que haja a retirada de disciplinas como Educação Física e Artes do Currículo.
Centro de Referências em Educação Integral procurou o MEC para se posicionar frente às críticas da medida provisória, mas não obteve respostas até o fechamento desta reportagem.

Baixa velocidade e falta de capacitação dificultam uso da internet em escolas


Daniel Mello - Repórter da Agência Brasil, 29/9/2016


Computador
O acesso à internet está disponível nas salas de aula de 43% das escolas públicas urbanasMarcello Casal Jr/Arquivo/Agência Brasil

A baixa velocidade de conexão e a falta de capacitação dos professores são entraves mostrados pela pesquisa TIC Educação, que trata do uso da internet como ferramenta pedagógica. Segundo o estudo divulgado hoje (29), apenas 39% dos docentes de escolas públicas e privadas tiveram alguma disciplina ou discussão durante a graduação sobre o uso da rede nas aulas. O índice chega a 54% entre os professores com até 30 anos e fica em 25% no grupo daqueles com mais de 46 anos.
“Não podemos exigir desse professor uma prática que ele não conhece”, ressaltou o gerente do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br),  Alexandre Barbosa, ao lembrar que navegar pela internet no dia a dia é diferente de usá-la para fins pedagógicos. “Isso é muito crítico. E provavelmente aí está uma das fontes que nós temos para apropriação dessa tecnologia para uso pedagógico nas escolas brasileiras”, acrescentou.
O acesso à internet está disponível nas salas de aula de 43% das escolas públicas urbanas e em 72% das classes de estabelecimentos particulares. No entanto, o ambiente virtual só é utilizado na própria sala de aula por 50% dos professores da rede particular e somente por 23% dos docentes da rede pública.
Apesar das dificuldades, a internet é usada de outras formas e em outros ambientes escolares. A  maioria dos docentes (73%) trabalha com o ambiente virtual em suas aulas de alguma maneira, com aproveitamentos diversos: aulas expositivas (52%), trabalhos sobre temas específicos (59%) e solução de dúvidas individuais (45%).
Há ainda o uso em laboratórios de informática, prática de 35% dos professores das redes municipais e estaduais de ensino e de 29% dos que trabalham em estabelecimentos particulares. O uso é, no entanto, menor do que o percentual de ambientes equipados com acesso à internet. Entre as escolas públicas, 76% declararam ter laboratórios com a rede disponível, índice que fica em 55% nos colégios particulares.

Para o coordenador de projetos e pesquisas do Cetic, Fabio Senne, os números refletem as políticas de inclusão digital nas escolas adotadas nos últimos anos, que priorizaram a instalação de pontos de acesso e equipamentos. “A ideia de enviar computadores e prover conexão está na base das políticas que tem mais de 15 anos de existência”, enfatizou.
Velocidade
Outra dificuldade apontada pela pesquisa que dificulta o uso da internet nas escolas é a baixa velocidade de conexão. Segundo o estudo, 37% das escolas têm conexões de até 2 megabits por segundo. “O que não é razoável para dividir com uma escola de 300 alunos”, avaliou Alexandre Barbosa.
As conexões fracas também impactam, de acordo com Barbosa, nos números de uso da internet na escola. Por isso, alguns colégios adotam, segundo ele, restrições ao uso da rede no ambiente escolar. “Tem uma questão de limitação técnica que é a capacidade da banda. Se todos os alunos se conectarem ao wifi e começarem a fazer download ou streaming[transmissão ao vivo], essa infraestrutura não é robusta o suficiente para permitir esse tipo de acesso. Mas é um sinalizador de que nós temos um problema que é a restrição do uso dessas tecnologias”, destacou.
A pesquisa aponta que 94% das escolas privadas e 84% das públicas têm redes sem fio. Entretanto, em apenas 16% das particulares o acesso é livre para todos, percentual que fica em 6% nos estabelecimentos estaduais e municipais. Em 19% das escolas privadas, os alunos podem acessar a rede sem fio com uma senha. Nas escolas públicas, esse percentual é de 16%. Em 58% das escolas particulares e em 62% das públicas a internet wifi não está aberta para os estudantes.
A pesquisa foi realizada pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), por meio do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br) e do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br). Foram entrevistados 898 diretores de escola, 861 mil coordenadores pedagógicos, 1,63 mil professores e 9,21 mil alunos entre setembro e dezembro de 2015. O estudo envolveu 898 escolas urbanas. 
Edição: Juliana Andrade

Es hora de promover un aprendizaje gratificante

Clarin, 30/09/2016

Hay un solo camino, la educación. Opinión
Por Guillermina Tiramonti. Investigadora de FLACSO y profesora de la UNLP.

El modelo disciplinar de las escuelas resulta de su propuesta pedagógica, o sea, de cómo organizan el proceso de enseñanza aprendizaje y qué roles definen para el alumno y para el docente.
La escuela tradicional, la que se instituyó en el siglo XIX y que marcó a fuego el sentido común de cómo debe ser una escuela, pensó al conocimiento como un conjunto de contenidos que debían ser incorporados por los alumnos, a medida que el docente los iba exponiendo en el frente de la clase, siempre con el auxilio de gráficos, mapas o cuadros.
Aquí los alumnos tienen un rol pasivo: solo deben prestar atención en silencio para registrar lo más fielmente posible aquello que se dice o se exhibe en el frente de la clase.
En las versiones más contemporáneas de esta escuela tradicional hay videos, proyecciones, intercambios entre alumnos y docentes, y trabajos grupales en los que los alumnos deben contestar una serie de preguntas buscando las respuestas en el manual de la materia de que se trate.
Niños y jóvenes, inmersos en el estimulante intercambio que les permiten las nuevas tecnologías, acostumbrados a la simultaneidad y la velocidad de los contactos, al ir venir de textos e imágenes, a la continua e interrumpida provocación de intervenir en el tránsito virtual; deben recortar diariamente una parte de su jornada, para escuchar una serie de clases en las que se les transmite una información que se puede encontrar en Internet o hacer como que se investiga compatibilizando preguntas y respuestas en un manual de clase.
A la compulsión de la quietud, a la obligada atención a lo carente de sentido e interés, le corresponden tumultuosos recreos en los que los alumnos se desahogan de tanta presión.
Hay, claro, otras propuestas pedagógicas, centradas en la creatividad y productividad de los alumnos, quienes allí investigan, resuelven problemas, inventan y construyen hipótesis que ponen a prueba conjuntamente con sus compañeros y docentes.
La disciplina, entonces, es otra.
No se espera el silencio sino el ruido del intercambio y del trabajo compartido. El movimiento que exige el desplazamiento para la consulta y el trabajo.
Aquí el recreo es un momento de descanso o de juego, no de desahogo.
Este modelo ya está presente en numerosas experiencias: en nuestro país, en la región y en muchas otras latitudes donde la tarea escolar se estructura en base a la asociación entre aprendizaje y gratificación, a la inversa de la asociación clásica entre enseñanza y sacrificio.

Quem paga o desperdício? Quem pode menos, Washington Novaes

A quantidade de ouro em lixões pode ser maior do que em minas de onde ele é extraído
*Washington Novaes
30 Setembro 2016 , Estado de S.Paulo
Relatório divulgado há poucos dias na Europa informa que o velho continente poderia economizar mais de US$ 1,8 trilhão por ano com avanços na gestão do lixo. E um terço disso seria resultado apenas da economia no consumo de recursos naturais. O Brasil, segundo a empresa consultora (McKinsey), também poderia ganhar muito, já que cada pessoa produz em média 330 quilos anuais de resíduos.
Um dos exemplo apontados de desperdício no lixo é o da quantidade de ouro em lixões, que pode ser maior que a existente em minas de onde o metal é extraído. A vantagem poderia ser ainda maior para recicladores se se reduzisse a carga tributária sobre produtos reciclados, em alguns casos maior que a aplicada a materiais virgens.
É um sinal de avanço, por isso a apresentação em Santa Catarina do primeiro documento declaratório de resíduos industriais, por um acordo entre a Associação Brasileira de Empresas de Tratamento de Resíduos e Efluentes e a Fundação do Meio Ambiente. Já aderiram ao sistema 18 mil empresas da região. E foram emitidos 328,7 mil manifestos de transporte de resíduos (retoquejor.com.br). Com isso, é possível acompanhar todas as etapas da cadeia de destinação de resíduos sólidos no Estado – influenciando a produção, o transporte, o destino e o aproveitamento desses resíduos.
A iniciativa é importante por muitos ângulos. Por exemplo: as emissões de gases do efeito estufa no Brasil provenientes do setor de resíduos sólidos continuam a crescer e, segundo o relatório lançado em setembro, atingiram o maior número nos últimos 44 anos, com 68,3 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO2) equivalentes – com aumento de 80% entre 2000 e 2014 e de 500% desde 1970. Embora essas emissões representem apenas 3,7% do total dos vários setores geradores (mudanças no uso da terra, energia, agropecuária e processos industriais), têm grande impacto na atmosfera por causa da geração de gases com maior potencial de aquecimento, como o metano (21 vezes mais potente que o dióxido de carbono) e o óxido nitroso (310 vezes mais potente).
Curiosamente, diz o estudo, as emissões de gases de efeito estufa em 2014 no País permaneceram estáveis em relação ao período anterior, apesar da queda de 18% na taxa de desmatamento na Amazônia. O Brasil emitiu 1,558 bilhão de toneladas de gás carbônico equivalente – uma redução de 0,9% em relação a 1,571 bilhão de toneladas emitidas em 2013. As razões ainda não foram explicitadas.
É possível que mais à frente os cientistas se deparem com dificuldades diante das taxas de desmatamento na Amazônia entre 2014 e 2015, que aumentaram 24%, de acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o Inpe (amazonia.org, 27/9). São dados a serem divulgados pelo Ministério do Meio Ambiente na primeira semana de outubro.
De agosto de 2014 a junho de 2015 foram desmatados 6.207 quilômetros quadrados, ou 6,45% acima do estimado em fins de novembro. Os Estados que mais desmataram, pela ordem, foram Pará, Mato Grosso e Rondônia. Uma das hipóteses é a de que os sistemas de controle já não funcionem com a mesma eficácia – embora haja diferenças entre alguns Estados e outros.
Uma revisão recente realizada pelo Inpe mostra que a perda florestal, com base nos dados de 2015, é de 6.207 quilômetros quadrados, quando em novembro se calculava em 5.835 km2 (16% mais que em 2014). O novo número é 4,1 vezes a área da cidade de São Paulo (Observatório do Clima, 27/9). Um exemplo mais das altas taxas de desperdício de patrimônios valiosos.
Há poucos dias foram publicados (Folha de S.Paulo, 26/9, texto de Leão Serva) dados sobre o desperdício num setor como o de veículos. Segundo o texto, “a propaganda de carros continua oferecendo virilidade e glamour, enquanto entrega congestionamento, estresse, doenças e aquecimento global”. E por isso mesmo “metade dos moradores da maior cidade do Brasil buscam jeitos de usar menos o automóvel”, diante das “irracionalidades deste: gasta cerca de 95% do combustível para ‘levar a si mesmo’; um veículo médio pesa cerca de 1,5 mil quilos, o motorista 75 kg (5%); e os carros levam geralmente só uma pessoa: quer coisa mais irracional?” E segue “o desfile de irracionalidades”: o carro só é usado para rodar 20 km diários; a desvalorização é rápida; são altos os custos com IPVA obrigatório, seguro, manutenção – um total de 10%, fora a desvalorização de 20%. Ainda é possível falar em incentivos fiscais. E outro estudo assegura que a gasolina deveria custar cinco vezes mais que seu preço.
Para quem achar que são os únicos desperdícios, depois de não ter êxito na venda de suas empresas de energia térmica (altamente poluidoras) a Petrobrás está tentando agora (Folha de S.Paulo, 27/9) agrupar todas as unidades numa única empresa, “para oferecer depois uma participação a outro investidor”. O plano prevê investimentos de US$ 74,1 bilhões nos próximos cinco anos e estabelece nova metade vendas de ativos, de US$ 19,5 bilhões entre 2017 e 2018. Nesse processo, deixará de atuar nos segmentos de petroquímica, fertilizantes e biocombustíveis. Mas continuará com a energia térmica, “para usar quando o nível dos reservatórios das hidrelétricas estiver baixo”.
Mais desperdício? A Fundação Getúlio Vargas mostra que “46% das 851 obras contratadas com recursos do FGTS no âmbito do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) não foram concluídas, estão paralisadas” ou nem sequer foram iniciadas (Danielle Nogueira, O Globo, 26/9). Dos R$ 28,6 bilhões em financiamentos, R$ 17,5 bilhões foram para 398 contratos cujas obras estão pendentes.
Desmatamento, destinação do lixo sem nada pagar ao poder público, nenhum pagamento de custos pela poluição do ar, etc., etc. – assim vamos, desperdiçando sem cobrar custos. O poder público paga, transfere para quem não tem poder.
*Jornalista e-mail: wlrnovaes@uol.com.br

EDUCAÇÃO STF Parlamentares apresentam 567 emendas para MP do ensino médi

Prazo para propostas se encerrou às 20 horas desta quinta; Medida Provisória já integra lista das que tiveram maior número de emendas



  •  
  • Mudanças no ensino médio foram feitas por meio de Medida Provisória 
    Estado de S.Paulo, 30/9.2016
    BRASÍLIA - A reforma do ensino médio proposta pela gestão Michel Temer não terá tramitação fácil nem no Legislativo nem no Judiciário. Nesta quinta-feira, 29, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin deu prazo de dez dias para explicações do presidente. No Congresso, antes mesmo de instalada a comissão mista que vai debater o tema, o texto recebeu 567 sugestões de alteração dos parlamentares. 
    Fachin também pediu esclarecimentos ao Legislativo, no âmbito da ação direta de inconstitucionalidade movida pelo PSOL. O partido quer suspender imediatamente os efeitos da medida, alegando que não há urgência que justifique a edição de MP e o mecanismo atrapalha o debate. O ministro pediu que a advogada-geral da União, Grace Mendonça, e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, também se manifestem. Fachin decidiu submeter o processo diretamente ao plenário, mas não há previsão de quando o tema será discutido. 
    Assim como outras MPs que trataram de temas polêmicos, a do ensino médio já figura na lista de propostas com o maior número de emendas no Congresso, como a MP dos Portos, de 2013, com 645. A recordista é a do Código Florestal, de 2012, com 696. De acordo com a secretaria de comissões, a média de apresentação de emendas em uma MP é de 100.
    A maior parte das emendas trata da manutenção de disciplinas na grade curricular obrigatória do ensino médio, como Educação Física, Filosofia e Artes. “Considero o mais importante a volta da Educação Física”, disse o deputado Chico Lopes (PCdoB-CE), autor de 30 emendas. “O maior choque da MP é essa liberalização das matérias. É um retrocesso monumental”, criticou o líder da bancada do PCdoB na Câmara, Daniel Almeida (BA). O parlamentar protocolou 15 emendas. 
    Ex-secretário da Educação de Pernambuco, o deputado Danilo Cabral (PSB-PE) teve a colaboração de entidades civis para 23 emendas, parte mantendo disciplinas obrigatórias. Membro da base aliada, Cabral disse que a reforma via MP não é o caminho mais adequado, principalmente porque o ambiente da educação é norteado por debates aprofundados, algo que não será possível no escasso período de tramitação. O deputado prevê reação da sociedade civil, principalmente dos estudantes. “É um ambiente que não aceita imposição”, ponderou. 
    Apoio. O senador Cristovam Buarque (PPS-DF) é favorável à reforma e até se ofereceu para relatar o projeto na comissão mista. “Não é a reforma ideal, pois a minha bandeira é a da federalização da educação. Mas é como a Lei do Ventre Livre: ainda não é a abolição da escravidão, mas é um começo.” 
    Mesmo simpático ao projeto, Cristovam escreveu 16 emendas. Diferentemente de outros parlamentares, ele concorda com o fim da obrigatoriedade de cursar Educação Física, Artes e Filosofia – mas sugere que a oferta seja obrigatória e a matrícula, opcional. 

    Em outra emenda, Cristovam sugere que a permissão para profissionais de “notório saber” darem aula no ensino médio seja dada mediante a apresentação de diploma de ensino superior, mesmo que não seja de licenciatura. Ele também pediu que o benefício às famílias do Bolsa Família exija frequência escolar no ensino médio.

    STF pede explicações a Temer e levará MP do novo ensino médio ao plenário


    Alan Marques/Folhapress
    BRASÍLIA, DF, BRASIL 17.12.2015. Ministro Edson Fachin participa da reunião do STF. Supremo Tribunal Federal retoma, em sessão plenária, julgamento dos ritos do processo de impeachment do mandato da presidente Dilma Rousseff. (FOTO Alan Marques/ Folhapress) PODER
    O ministro Edson Fachin em sessão do Supremo Tribunal Federal

    O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Edson Fachin decidiu nesta quinta-feira que levará ao plenário da corte o processo assinado pelo PSOL contra as mudanças propostas na reforma do ensino médio.

    Relator do caso, Fachin poderia emitir um despacho monocrático sobre os pedidos das legendas. Nas palavras dele, "tendo em vista a relevância da matéria e sua importância para a ordem social", a questão será compartilhada com os demais ministros.
    Em seu despacho, o relator estipulou prazo de 10 dias para que a Presidência da República, o Senado, a Câmara e a comissão mista formada para analisar a medida provisória (MP) enviem informações a respeito dos argumentos apresentados pela sigla.
    Fachin determina ainda que, em até cinco dias, a AGU (Advocacia-geral da União) e a PGR (Procuradoria-geral da República) enviem seus pareceres sobre os pleitos do PSOL. O partido entrou com uma ação nesta terça (27) para pedir que o Supremo declare inconstitucionais as alterações previstas na medida provisória que institui novas regras para o sistema educacional brasileiro.
    O PSOL argumenta que o plano do governo federal, se aprovado, acarretará na perda de qualidade do ensino, promoverá o aumento das diferenças sociais e o descompasso entre os alunos dos ensinos médio e fundamental.
    REFORMA DO ENSINO MÉDIO
    "Com a [...] não obrigatoriedade de oferecer todo o conteúdo em cada escola, é evidente que as escolas públicas, já sem muitos recursos, serão obrigadas a oferecer apenas o mínimo. Enquanto isso, a classe social mais privilegiada será exposta aos mais variados conteúdos. É uma norma que não se coaduna com a relação intrínseca entre a isonomia e o direito à educação", afirma.
    A peça afirma que a admissão de profissionais sem formação na área de educação ou pedagogia, como a reforma permite, afronta o "princípio constitucional da garantia do padrão de qualidade do ensino público".
    A ação direta de constitucionalidade, assinada pelo presidente do PSOL, Raimundo Silva de Araújo, sustenta que a jornada de 7 horas de aula, imposta pela reforma, pode afastar das escolas alunos que se dividem entre trabalho e estudos.
    "A não ser que o Estado esteja disposto a incrementar políticas públicas que favoreçam o comparecimento de adolescentes às escolas por 7 horas a dentro, podendo ir para casa e reforçar seu aprendizado em seguida, a proposta é elitista e voltada apenas aos estudantes que têm o privilégio de não trabalhar enquanto estudam", acusa. 

    Implantar um currículo espartano, através de uma MP, está longe do ideal, Fernanda Torres


    Tenho um aluno do segundo ano do ensino médio em casa. Dono de um raciocínio lógico capaz de solucionar questões complexas de matemática, ele aprende com facilidade e demonstra aversão pelo atual sistema de ensino.
    Filho, neto e sobrinho de autodidatas, todos ligados às artes, meu rebento reclama do pouco tempo reservado à sociologia, à filosofia e à literatura, e se ressente de um intercâmbio maior entre as disciplinas.
    Tédio e raiva resumem o seu sentimento com relação à escola.
    Mangabeira Unger, em entrevista ao programa "Diálogo", fez coro ao diagnóstico de que estudantes do século 21 frequentam salas de aula do século 19. Danilo Miranda, diretor do milagroso Sesc paulista, afirma que o currículo procura formar mão de obra e não cidadãos.
    Editoria de Arte/Folhapress
    Ilustração de Marta Mello da Coluna de Fernanda Torres de 30 de setembro de 2016
    Há, mesmo, algo de podre na educação.
    Os colégios que não se enquadram no modelo competitivo do Enem correm o risco de soçobrar no mercado. Para garantir a boa colocação na lista de excelência, adestra-se os colegiais para o provão à partir do 1º ano do fundamental 2.
    Dali para frente, triunfa um funil angustiado de múltiplas escolhas, onde pouco importa a curiosidade do aluno. O cardápio de matérias lembra o daqueles restaurantes que servem de estrogonofe à filé à cubana e mais entope do que alimenta, formando um exército de adolescentes paranoicos e enfadados.
    A flexibilização do currículo é bem-vinda; mas o plano de dobrar o tempo de duração na carteira vitoriana, abolindo filosofia, sociologia, artes e esporte me espanta.
    Quando visitei o Escorial, palácio construído por Felipe 2º nas cercanias de Madri, chamou-me a atenção os afrescos em homenagem às sete artes liberais, que ornam o teto da biblioteca.
    Base do pensamento escolástico, criado nos monastérios medievais com o intuito de conciliar o ensino da fé e da razão, as artes da retórica, da dialética, da música, da gramática, da aritmética, da geometria e da astrologia pretendiam formar homens livres.
    A filosofia, a arte e a sociologia são um grande antídoto para o grilhão da decoreba. Elas relacionam, como poucas cadeiras, o estudo de história, geografia, política, ciência, letras e matemática, desenvolvendo o diálogo, a criatividade, o raciocínio e a argumentação.
    Meu filho, que é um furioso, no sentido romântico da palavra, reagiu aos cortes dizendo que o objetivo das medidas é escravizar a rotina de estudo para impedir que os alunos pensem.
    A Finlândia reduziu o tempo de escola, aposentou o dever de casa, descartou a múltipla escolha e galgou o primeiro lugar no ranking de educação mundial.
    Apostar no ócio criativo num país como o nosso, com problemas de segurança, habitação, saúde e saneamento seria uma guinada arriscada, mas implantar um currículo espartano, que não considera a saúde mental e física dos alunos, através de uma MP, está longe do ideal.
    Dentre todas as dúvidas práticas suscitadas pelas novas diretrizes, uma me perturba em especial.
    Não há método que resista a um professor ruim. Se mal se consegue arregimentar quadros capazes de alfabetizar a contento, de onde surgirão os milhares de mestres não licenciados, dotados de notório saber, que preencherão as demandas de um horário integral no ensino médio?
    Essa é a questão.