21 de maio de 2013

ENTREVISTA DAVID SHAMBAUGH A China é uma potência solitária, sem grandes aliados



Sinólogo americano desconfia da capacidade de o país exercer poder global
PATRÍCIA CAMPOS MELLO, Folha DE SÃO PAULO, 21/5/2012

Um dos maiores especialistas do mundo em China, David Shambaugh, afirma que há um exagero em relação à influência chinesa no mundo.
"A China está superestimada, ela é apenas uma potência parcial, não é uma superpotência e nem será no médio prazo", disse à Folha Shambaugh.
O especialista americano, que é diretor do programa sobre a China na Universidade George Washington, acaba de lançar o livro "China Goes Global: The Partial Power" (A China se torna global: o poder parcial).
Ele esteve no Brasil para uma palestra na Fundação iFHC. Abaixo, leia trechos da entrevista que ele concedeu à Folha.
Folha - O senhor afirma que a China ainda é uma "potência parcial". O que falta para a China se transformar em uma superpotência?
David Shambaugh - Economicamente, a coisa mais importante que a China precisa fazer para se tornar uma verdadeira superpotência é desenvolver inovação. A China não é uma sociedade inovadora, é uma sociedade da cópia, apesar de todo o investimento em pesquisa e desenvolvimento. A China já é uma potência comercial, em volume, mas os produtos que saem do país não são desenhados lá, são apenas montados lá.
E militarmente?
A China precisa ser capaz de projetar poder globalmente, e atualmente eles só conseguem fazer isso em sua região. Eles não têm bases no exterior.
Mas os Estados Unidos vêm cortando brutalmente seus gastos em defesa. Isso não pode mudar a dinâmica no médio prazo?
Não. A diferença entre as forças chinesas e as americanas é enorme. A vantagem tecnológica dos Estados Unidos é muito grande. Outro problema é o "soft power" [poder de influenciar outros países por meios culturais ou ideológicos, sem necessidade de força militar].
E os Institutos Confúcio, não ajudam?
Os institutos são bons para ensinar a língua chinesa. Mas "soft power" é fazer com que as pessoas queiram te emular, queiram ser como você, que o país funcione como um ímã que as pessoas querem imitar. E você não encontra muitos países ou pessoas querendo imitar a China. Ninguém admira o sistema político chinês. E é um impedimento para a criatividade e inovação de seu povo.
O sr. é uma voz isolada, uma vez que a maioria dos sinólogos é bem mais entusiástica a respeito da ascensão da China. Você acha que há exageros sobre a China?
Com certeza, a China é superestimada de duas maneiras: alguns superestimam a influência que a China exerce; outros, que são a maioria, exageram a ameaça que a China representa.
O sr. acha que o fato de o modelo econômico chinês, baseado em exportações e grandes investimentos domésticos em infraestrutura, estar exaurido, vá levar o país a uma grande desaceleração no crescimento em breve?
Está claro que o modelo de crescimento da China se esgotou, e as autoridades chinesas sabem disso. Eles vêm discutindo a necessidade de mudar [aumentar o consumo doméstico], mas não conseguiram, porque há enorme resistência a isso.
As empresas estatais são muito corruptas e não querem mudanças no modelo.
Mas o sr. vê uma queda significativa na taxa de crescimento?
Bom, o primeiro problema é: quão confiáveis são as estatísticas chinesas? Há todo tipo de distorções e muitos economistas dizem que a taxa de crescimento pode ser até dois pontos percentuais inferior ao que é divulgado.
Mas, fora isso, acho que a China conseguirá manter os 6%, 5% até 2020, 2025.
Quando a China ultrapassar os EUA em tamanho da economia, qual será o status global do país?
Provavelmente o mesmo que hoje em dia. A China é uma potência solitária, que não possui grandes aliados. Os únicos aliados são Camboja, Paquistão, Coreia do Norte e Rússia.
Mas e os Brics?
Não tenho certeza de que os países dos Brics tenham os mesmos objetivos. Há divergências comerciais entre os membros. Entre a Índia e a China, há muitos problemas territoriais e militares. Rússia e China concordam em muitas questões, mas abaixo da superfície há uma grande desconfiança.


RAIO-X - DAVID SHAMBAUGH
CARREIRA
Diretor do programa sobre a China na Universidade George Washington, já foi analista do Departamento de Estado dos EUA e consultor do Fórum Econômico Mundial
LIVROS
"China Goes Global: The Partial Power" (2013); "Charting China's Future: Domestic and International Challenges" (2011), "American and European Relations with China" (2008)

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